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  • Foto do escritorFelipe R. Sant'Anna.

Artigo 147-A do Código Penal: O que é o crime de "stalking"?


O presidente Jair Bolsonaro sancionou nesta quarta (31/3) o Projeto de Lei nº1.369/19 que que torna crime a prática de "stalking".

Mas antes de falarmos sobre o crime precisamos entender um pouco sobre o que é a prática de stalking.

O termo stalking vem do inglês, derivando da palavra stalk que significa "perseguir", "aproximar-se silenciosamente", "atacar". Ou seja, o stalking é a prática de atos que um determinado sujeito comete invadindo a intimidade da vítima, coagindo, perturbando e ameaçando a sua liberdade, ao ponto de exercer sobre esta influência emocional.

O stalker (sujeito ativo do ato) age de forma diversa, seja presencialmente ou através dos meios virtuais, de forma repetitiva, insistente, seja por presenças nos locais frequentadas pela stalkeada (vítima do ato), ou por ligações telefônicas, mensagens e outros meios de se fazer próximo a esta. A motivação deste ato pode ser a mais variada, como vingança, raiva, supostos sentimentos amorosos ou qualquer outra causa subjetiva.

Até o advento da agora Lei nº 14.132/21 que acrescentou o Art. 147-A ao Código Penal, o ato de stalkear não era considerado crime no Brasil, mas sim uma contravenção penal prevista no artigo 65 da Lei de Contravenções Penais (Decreto Lei nº 3688/41), em seu artigo 65, sob o nome de "Perturbação da Tranquilidade", com pena de prisão simples de 15 dias a dois meses


"Art. 65. Molestar alguem ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovavel:

Pena - prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis."


Com o advento da já referida lei, assim ficou o artigo 147-A do Código Penal:


"Perseguição

Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:

I - contra criança, adolescente ou idoso;

II - contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;

III - mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.

§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

§ 3º Somente se procede mediante representação."


Agora com a nova lei o agora crime ganhou nova arquitetura, com mais verbos nucleares, ou seja, mais condutas que possam ser considerado o crime de stalking, que são: "Perseguir"; "Ameaçar"; "Restringir"; "Invadir"; "Perturbar". Além de novas elementares subjetivas que são: "Alguém"; "Integridade física ou psicológica" e; "Capacidade de locomoção".

O novo crime também tem suas elementares normativas que são: "Reiteradamente"; "Por qualquer meio" e; "Sua esfera de liberdade ou privacidade".

O crime de perseguição, em razão da elementar reiteradamente, é habitual, pois exige a reiteração dos atos por parte do sujeito ativo. Assim, não se consuma o delito com a mera prática de um ato, havendo a necessidade de habitualidade no comportamento a ponto de criar o temor ou perturbação da vítima.

Ainda, o crime pode ser praticado sob as modalidade dolo direto e eventual. Neste ponto, podemos entender que a habitualidade exigida pelo tipo penal não afasta necessariamente a possibilidade do dolo eventual, pois o sujeito ativo pode, mesmo não desejando diretamente, assumir o risco, com o seu comportamento, de dar causa ao resultado normativo, caracterizando a perseguição.

Este crime consuma-se com a efetiva caracterização da perseguição reiterada capaz de causar ameaça à integridade física ou psicológica, restrição à capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadir ou perturbar sua esfera de liberdade ou privacidade da vítima.

É importante salientarmos que o novo crime de perseguição possuí majorantes previstas nos §§ 1º e 2º do artigo, em que a causa de aumento de pena é de 1/2.

Em seu §1º, as causas de aumento de pena são:

Inciso I - contra criança, adolescente ou idoso: Neste caso temos uma norma penal em branco homogênea, pois os conceitos de criança, adolescente e idoso são retirados respectivamente do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei nº 8.069/90 - Art. 2º) e Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03 - Art. 1º);

Inciso II - Também se trata de uma norma penal em branco homogênea, encontrando-se no §2º-A do art. 121 do Código Penal no que tange ao conceito de razões da condição de sexo feminino, sendo, igualmente, norma remetida;

Inciso III - Já neste inciso trata-se de uma majorante pelo concurso de pessoas, ou com o emprego de qualquer arma (branca ou de fogo), pois, no entendimento do legislador, esse fato pode impor a vítima maior risco para sua integridade, merecendo assim ser punida de forma mais severa.

Já no §2º o legislador prevê que além das penas cominadas ao crime de perseguição, também serão aplicadas as penas cominadas à violência, podendo haver assim o concurso de crimes.

Por fim, o legislador deixou claro no §3º do Artigo 147-A que este crime é de Ação Penal Pública condicionada à representação da vítima, que é aquela que, embora deva ser ajuizada pelo MP, depende da representação da vítima, ou seja, a vítima tem que querer que o autor do crime seja denunciado.


Considerações

A nova lei trouxe importante inovação legislativa, haja vista que a maioria das vítimas desse crime são mulheres e, diante do silêncio da Lei Maria da Penha quanto a essa modalidade de violência, encontravam-se desamparadas, dado a tibieza da anterior definição ser tratada somente como contravenção penal e, ainda, de difícil determinação, haja vista ao pouco esclarecimento do artigo 65 do Decreto Lei.

Por isso, é possível afirmar que, a sanção presidencial que criou o tipo penal pode ter vindo para, de fato, preservar ainda mais os direitos constitucionais da privacidade, intimidade e vida privada, previstos na redação do artigo 5º, inciso X da nossa Constituição, com o objetivo precípuo de resguardar a dignidade humana. Ademais, a nova tipificação além de ser um instrumento punitivo ao sujeito que adotar o comportamento previsto no caput do novo artigo, poderá se tornar também instrumento preventivo de novos crimes.

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